O Estado pode ser considerado sob três aspectos; sob três perspectivas:
1 – Forma de Estado;
2 – Forma de Governo;
3 - Sistema ou Regime de Governo.
Vamos tratar do primeiro aspecto que é a forma de Estado.
Vamos tratar do primeiro aspecto que é a forma de Estado.
1 – Forma de Estado: para entendermos forma de Estado, devemos responder a uma pergunta; a uma indagação, e a resposta a esta indagação significará a forma de Estado.
A pergunta é a seguinte:
Dentro de um determinado território, quantas pessoas jurídicas com capacidade política existem? Dentro de um determinado território, quantos centros que manifestam o poder existem?
Para responder a essa indagação, temos que citar o exemplo da República Oriental do Uruguai. Dentro do território da República Oriental do Uruguai existe apenas um centro que manifesta poder; existe apenas uma pessoa jurídica com capacidade política. Ou seja, uma única pessoa jurídica dotada de legislativo próprio; sob as pessoas e coisas do território uruguaio incide uma única espécie de lei; só existe uma lei nacional. Estamos, no Uruguai, diante de um Estado Unitário. O Uruguai é dividido em administrações que não possuem legislativo próprio; não editam leis; as administrações respeitam a lei do todo; uma lei que é nacional.
No Brasil: dentro do território da República Federativa do Brasil, quantas espécies de pessoas políticas com capacidade legislativa existem?
a) União: Congresso Nacional;
b) Estado-membro: Assembléia Legislativa;
c) Município: Câmara de Vereadores.
Sobre pessoas e coisas, dentro do território da República Federativa do Brasil, quantas espécies de leis incidem?
Ao menos três espécies de leis: pagamos Imposto de Renda; pagamos ICMS, pagamos IPTU. Portanto, sobre pessoas e coisas dentro do território da República Federativa do Brasil, incidem ao menos três espécies de leis.
Inclui-se, ainda aqui, o Distrito Federal. Portanto, temos quatro centros que manifestam poder ou quatro pessoas jurídicas com capacidade política.
A República Federativa do Brasil é um Estado Composto.
Conclusão: falar de forma de estado é fazer referência a pessoa jurídica com capacidade política; é fazer referência a pessoa jurídica com legislativo próprio; se dentro de determinado território houver apenas uma pessoa jurídica com capacidade política; que só incide apenas uma espécie de lei sobre pessoas e coisas, estaremos diante de um Estado Unitário; se dentro de determinado território existirem duas ou mais pessoas jurídicas com capacidade política, estaremos diante de um Estado composto. Esse Estado composto pode ser de duas espécies:
Confederação e Federação.
Isso não é pacífico: existe quem entenda que confederação não é forma de estado, mas sim uma associação de estados. Nós vamos partir da posição doutrinária de que confederação é uma forma de estado. Para diferenciar esses conceitos de federação e confederação, precisamos entender o contexto histórico. Direito Constitucional é, sobretudo, História. E a História é dinâmica. Um pouco de História dos Estados Unidos:
A Inglaterra possuía, aqui nas Américas, treze colônias. Em 1776, estas treze colônias se rebelaram contra a Inglaterra e se declararam independentes; passaram a ser estados independentes. Em 1777, esses treze estados independentes, ex-colônias da Inglaterra na América do Norte, assinaram um Tratado Internacional que recebeu o nome de “Os Arquivos da Confederação”, criando a Confederação dos Estados Unidos. Esse Tratado Internacional tinha o objetivo de união dos treze estados na luta contra a Inglaterra; tinha objetivos militares. Em 1787 os treze estados independentes fizeram uma convenção na Filadélfia e resolveram mudar a forma de estado: de confederação passaram a federação. Surgem os Estados Unidos da América.
Diferenças entre confederação e federação:
CONFEDERAÇÃO | FEDERAÇÃO |
Nasce através de um tratado internacional | Nasce de uma constituição |
As unidades parciais têm direito de secessão (separação) | As unidades parciais não têm direito à separação |
As unidades parciais são dotadas de soberania | As unidades parciais são dotadas de autonomia |
Unidade parcial: é a denominação da parte na forma de estado. A unidade parcial recebe os mais variados nomes. A Suíça recebe o nome de federação, apesar de ser uma confederação; lá a unidade parcial recebe o nome de Cantão; na Alemanha (que é uma federação) a unidade parcial recebe o nome de Laiander; na Argentina recebe o nome de província; existem determinadas unidades parciais denominadas de departamentos. Na nossa federação, as unidades parciais recebem o nome de Estados-membros.
Nós vivemos em uma federação, o que nos é revelado pelo art. 1º da CF. Aliás, nós vivemos em uma federação desde 1881. A nossa Constituição Republicana criou a nossa federação.
Por que lá nos EUA cada Estado possui o seu Código Penal, o seu Código de Processo Penal? Por que no Texas tem a pena de morte e em Nova York não tem? Se lá é uma federação e aqui também é uma federação e nós não temos essa realidade?
Isto é em decorrência do processo histórico da federação norte-americana. Percebam que lá, nos EUA, existiam treze colônias; treze estados independentes que se agregaram: os EUA é uma federação por agregação ou federação centrípeta.
Aqui no Brasil nós tínhamos, até a Proclamação da República, um Estado Unitário que se repartiu, portanto, a nossa federação é por desagregação ou centrífuga.
As províncias, até 1789, não tinham um legislativo próprio; não editava leis. A federação foi criada com a Proclamação da República em 1789, surgindo então a nossa federação.
Em razão disso, lá na federação americana, os Estados-membros têm maior autonomia, por isso, tem o seu Código Penal; aqui os Estados-membros têm menos autonomia, porque o nosso Estado surgiu de um estado unitário que se desagregou; lá eram treze estados independentes que se uniram (agregação).
Da mesma forma, é com a legislação eleitoral: cada Estado Americano tem o seu Código Eleitoral. Em alguns Estados, se um candidato eleito a representante (senador, deputado) vier a falecer antes da posse, quem assume é a sua mulher. Noutros Estados, é o governador quem escolhe quem vai lhe substituir; depende do Estado. Isso se dá em virtude de maior autonomia dos Estados.
CARACTERÍSTICAS DA FEDERAÇÃO
I - Indissolubilidade do vínculo – o vínculo é indissolúvel, porque as unidades parciais não têm direito de separação ou de secessão. Esta característica se encontra presente na nossa Constituição – art. 1º:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
Essa característica é tão importante que o legislador constituinte nos dá notícia de alguns instrumentos para protegê-la:
a) Intervenção Federal – art. 34, CF:
Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:
I - manter a integridade nacional;
A Intervenção Federal é um instrumento que protege a indissolubilidade do vínculo.
Imaginemos o seguinte: o Rio Grande do Sul quer se separar do Brasil; criar uma república gaúcha, isso é possível?
Não, porque a união é indissolúvel; é caso de intervenção do todo na parte.
Esse tema é tão importante que o Direito Penal (que é a última ratio) também é um instrumento da indissolubilidade do vínculo.
O art. 109, IV, da Constituição Federal fala em crime político (competência da Justiça Federal com atribuição da Polícia Federal). Os crimes políticos estão na Lei 7170/83 – Lei de Segurança Nacional. Pregar contra a Federação é crime federal. Art. 11, dessa Lei:
Art. 11 - Tentar desmembrar parte do território nacional para constituir país independente.
Pena: reclusão, de 4 a 12 anos.
Tudo para proteger a indissolubilidade do vínculo, que é uma característica importante da Federação. Tanto que, se por acaso, o cidadão for condenado ou absolvido por um crime político, só cabe um recurso: Recurso Ordinário diretamente para o STF, tal a importância desse tipo de crime - art. 102, II, “b”, CF:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
II – Divisão constitucional de competência – só existe federação se tiver divisão constitucional de competência; esta característica se encontra na nossa Constituição – compete a União (art. 21 e 22); compete aos Estados-membros (art. 25); compete ao DF (art. 32); compete aos Municípios (art. 29 e 30). Temos ai uma divisão constitucional de competência.
III – Participação das unidades parciais (Estados-membros, DF) na formulação da vontade geral - eles participam da criação da lei, porque no Senado estão os representantes dos Estados-membros e do DF (art. 46, CF) e na Câmara dos Deputados estão os representantes do povo (art. 45, CF). Lembre-se que os senadores não são os representantes do povo, mas sim dos Estados-membros e do DF. O segundo artigo que nos revela a participação das unidades parciais na vontade geral é o art. 60, III, da CF:
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
Assim sendo, temos na nossa Constituição, essa característica da federação, qual seja, a participação das unidades parciais na formulação da vontade geral.
IV – Existência de um tribunal encarregado de manter a supremacia da constituição. Nós temos, no Brasil, um Tribunal que é o encarregado da guarda da Constituição: o STF – art. 102, I, CF:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
V – A própria existência da Constituição - só há que se falar em federação com uma Constituição. Porque a confederação possui Tratado Internacional.
Portanto, uma característica dessa forma de estado, federação ou federativa, é a própria Constituição. A forma de estado é uma cláusula pétrea; é um núcleo intangível da Constituição – art. 60, §º 4º:
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
Aqui, neste dispositivo, a nossa Constituição é super-rígida.
2 - Forma de Governo - nós respondemos a seguinte pergunta:
De que maneira o poder é exercido dentro de um território?
Respondendo a esta indagação, chegaremos à forma de governo.
No ano de 340 AC, Aristóteles disse: existem três formas de governos: Monarquia (governo de um só) Aristocracia (governo de mais de um, porém de poucos) e República (governos de muitos).
Para Aristóteles, essas três formas de governos poderiam ser corrompidas, viciadas. Se a Monarquia fosse viciada, corrompida, nós teríamos a Tirania. Se a Aristocracia fosse viciada, corrompida, nos teríamos a Oligarquia. Se a República fosse viciada, teríamos a Demagogia.
Em 1513, Maquiavel, no livro “O Príncipe”, disse que os Estados ou são Principados ou são Repúblicas. A partir daí, duas formas de governos: Monarquia, que ele chamava de Principado, ou República. É lógico, que em 1513, essa diferença entre Monarquia e República tinha um sentido. Hoje, ao menos no Ocidente, não temos Monarquias puras; nós temos Monarquias Constitucionais.
Respondendo aquela pergunta: na Monarquia o poder é exercido de maneira hereditária, vitalícia e irresponsável; na República o poder é exercido de forma eletiva, temporária e responsável (existe a responsabilidade política, pelo menos em tese).
A forma de governo não é uma cláusula pétrea; existe quem defenda que seja. Porém, majoritariamente entende-se que não é uma cláusula pétrea.
Apesar da forma de governo não ser uma cláusula pétrea, a forma de governo republicana é um princípio constitucional sensível em sede estadual.
Os princípios constitucionais sensíveis estão no art. 34, VII, CF:
Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) direitos da pessoa humana;
c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.
3 – Sistema ou regime de governo - deve-se responder a seguinte pergunta:
De que forma se relaciona o legislativo e o executivo?
A maneira pela qual se relaciona o legislativo e o executivo marca o sistema de governo. É um traço diferenciador do sistema ou regime de governo, a relação entre o legislativo e o executivo.
Nós temos, em regra, dois sistemas ou regimes de governo: Presidencialismo e Parlamentarismo.
As diferenças entre eles são:
PRESIDENCIALISMO | PARLAMENTARISMO |
Uma única autoridade exerce a função executiva – art. 76, CF: Art. 76. O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado. | Duas ou mais autoridades exercem a função executiva |
Executivo monocrático: uma única autoridade exerce a função de chefe de estado e de chefe de governo | Executivo dual: as funções de chefe de estado e de chefe de governo são desempenhadas por autoridades distintas |
Existe independência política do executivo em relação ao legislativo | Dependência política do executivo em relação ao legislativo |
O mandato do chefe do executivo é determinado | O mandato daquele que exerce a função executiva pode ser reduzido pelo legislativo |
Existem duas espécies de parlamentarismo:
a) Parlamentarismo Monárquico constitucional: rei exercendo a função de chefe de estado; primeiro-ministro exercendo a função de chefe de governo (Inglaterra, Espanha).
b) Parlamentarismo Republicano: presidente exercendo a função de chefe de estado; primeiro-ministro exercendo a função de chefe de governo (Itália, França).
Brasil - Parlamentarista – de setembro de 1961 até fevereiro de 1963: Tancredo Neves era o Primeiro-Ministro e João Goulart era o Presidente. O sistema ou regime de governo não é uma cláusula pétrea; não é um núcleo intangível da Constituição.
Importante: no art. 84 da Constituição Federal estão elencadas as atribuições do chefe do executivo; neste artigo nós temos um rol dessas atribuições; dentre estas atribuições estão aquelas que ostentam a natureza de atribuições de chefe de estado e aquelas que ostentam a natureza de chefe de governo. O art. 84 nos dá notícia das atribuições do chefe do executivo: o Presidente exercendo as duas espécies de atribuições de chefe de executivo; ambas desempenhadas pela mesma pessoa: o que significa dizer que nós temos um Estado que adota o sistema ou regime presidencialista.
Art. 84, VII, CF:
VII - manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos;
Ao manter relações com estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos, o Presidente da República está a exercer a função de Chefe de Estado. Isso significa que, no exercício da função de Chefe de Estado, o Presidente fala, se manifesta, em nome da unidade nacional. Isso quer dizer que ele se manifesta em nome da República da Federativa do Brasil.
Para a ordem internacional, não interessa qual é a forma de nosso estado. Para a ordem internacional, não interessa se o nosso estado adota a forma de estado unitária ou composta; se é composta a federação ou confederação; na ordem internacional, essa realidade não tem qualquer valor, porque o que interessa é o exercício da chefia de Estado pelo Presidente da República; o que interessa é que nós pertencemos a uma soberania.
Ainda no art. 84, VII – cabe, também, ao Presidente, acreditar os seus representantes diplomáticos.
Exemplificando: um Embaixador dos EUA é nomeado pelo Presidente dos EUA. Para que ele (Embaixador) possa exercer as suas atribuições dentro do território nacional, precisa ser acreditado pelo Presidente da República no exercício da função de Chefe de Estado. Ele (Embaixador), chegando ao Brasil, vai ao Palácio do Planalto, marca uma audiência com o Presidente da República; entrega as suas credenciais ao Presidente que as lê e acredita aquele representante diplomático, ou seja, dar a ele a possibilidade de exercer as suas atribuições dentro do território nacional.
Pergunta: esse é o exercício de Chefe de Estado ou de Governo?
Função de Chefe de Estado.
Art. 84, VIII:
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;
Esta é, também, uma atribuição de Chefe de Estado.
O Presidente, quando celebra um tratado internacional, está a exercer a função de Chefe de Estado.
Percebam que no exercício da atribuição de Chefe de Estado, o Presidente fala em nome de todos nós.
Ele se manifesta em nome da República Federativa do Brasil, defendendo, zelando pelo pacto federativo.
Exercício da atribuição da forma de governo – art. 84, II:
II - exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal;
Quando o Presidente exerce a chefia superior da Administração Pública ele está a exercer a função de Chefe de Governo. Nesse instante, o Presidente não está falando pela República Federativa do Brasil, mas em nome da União Federal, que é uma Pessoa Jurídica de Direito Público Interno.
É lógico, que a República Federativa do Brasil, não possui servidores próprios; ela se vale dos próprios servidores da União Federal. Percebam que, tecnicamente, deveria ser o Presidente a nomear os delegados da polícia federal, mas ele delega isso ao Ministro da Justiça.
Essas duas atribuições são enfeixadas na mesma autoridade, por isso, executivo monocrático.
Isso não ocorre no Parlamentarismo.
No parlamentarismo, temos duas ou mais autoridades exercendo a função executiva.
Nós temos duas espécies de parlamentarismo: parlamentarismo monárquico constitucional e parlamentarismo republicano.
No parlamentarismo monárquico constitucional, nós temos reis exercendo a função de Chefe de Estado e Primeiro Ministro exercendo a função de Chefe de Governo; diversamente do que ocorre no parlamentarismo republicano, onde o Presidente exerce a função de Chefe de Estado e Primeiro Ministro exercendo a função de Chefe de Governo. No parlamentarismo nós temos o denominado executivo dual e no presidencialismo temos o denominado executivo monocrático