terça-feira, 7 de junho de 2011

DIVISÃO ESPACIAL DO ESTADO

O Estado pode ser considerado sob três aspectos; sob três perspectivas:
1 – Forma de Estado;
2 – Forma de Governo;
3 - Sistema ou Regime de Governo.


Vamos tratar do primeiro aspecto que é a forma de Estado.
1 – Forma de Estado: para entendermos forma de Estado, devemos responder a uma pergunta; a uma indagação, e a resposta a esta indagação significará a forma de Estado.
A pergunta é a seguinte:
Dentro de um determinado território, quantas pessoas jurídicas com capacidade política existem? Dentro de um determinado território, quantos centros que manifestam o poder existem?
Para responder a essa indagação, temos que citar o exemplo da República Oriental do Uruguai. Dentro do território da República Oriental do Uruguai existe apenas um centro que manifesta poder; existe apenas uma pessoa jurídica com capacidade política. Ou seja, uma única pessoa jurídica dotada de legislativo próprio; sob as pessoas e coisas do território uruguaio incide uma única espécie de lei; só existe uma lei nacional. Estamos, no Uruguai, diante de um Estado Unitário. O Uruguai é dividido em administrações que não possuem legislativo próprio; não editam leis; as administrações respeitam a lei do todo; uma lei que é nacional.
No Brasil: dentro do território da República Federativa do Brasil, quantas espécies de pessoas políticas com capacidade legislativa existem?
a) União: Congresso Nacional;
b) Estado-membro: Assembléia Legislativa; 
c) Município: Câmara de Vereadores.
Sobre pessoas e coisas, dentro do território da República Federativa do Brasil, quantas espécies de leis incidem?
Ao menos três espécies de leis: pagamos Imposto de Renda; pagamos ICMS, pagamos IPTU. Portanto, sobre pessoas e coisas dentro do território da República Federativa do Brasil, incidem ao menos três espécies de leis.
Inclui-se, ainda aqui, o Distrito Federal. Portanto, temos quatro centros que manifestam poder ou quatro pessoas jurídicas com capacidade política.
A República Federativa do Brasil é um Estado Composto. 
Conclusão: falar de forma de estado é fazer referência a pessoa jurídica com capacidade política; é fazer referência a pessoa jurídica com legislativo próprio; se dentro de determinado território houver apenas uma pessoa jurídica com capacidade política; que só incide apenas uma espécie de lei sobre pessoas e coisas, estaremos diante de um Estado Unitário; se dentro de determinado território existirem duas ou mais pessoas jurídicas com capacidade política, estaremos diante de um Estado composto. Esse Estado composto pode ser de duas espécies:
 Confederação e Federação.
Isso não é pacífico: existe quem entenda que confederação não é forma de estado, mas sim uma associação de estados. Nós vamos partir da posição doutrinária de que confederação é uma forma de estado. Para diferenciar esses conceitos de federação e confederação, precisamos entender o contexto histórico. Direito Constitucional é, sobretudo, História. E a História é dinâmica. Um pouco de História dos Estados Unidos:
A Inglaterra possuía, aqui nas Américas, treze colônias. Em 1776, estas treze colônias se rebelaram contra a Inglaterra e se declararam independentes; passaram a ser estados independentes. Em 1777, esses treze estados independentes, ex-colônias da Inglaterra na América do Norte, assinaram um Tratado Internacional que recebeu o nome de “Os Arquivos da Confederação”, criando a Confederação dos Estados Unidos. Esse Tratado Internacional tinha o objetivo de união dos treze estados na luta contra a Inglaterra; tinha objetivos militares. Em 1787 os treze estados independentes fizeram uma convenção na Filadélfia e resolveram mudar a forma de estado: de confederação passaram a federação. Surgem os Estados Unidos da América.
Diferenças entre confederação e federação:
CONFEDERAÇÃO
FEDERAÇÃO
Nasce através de um tratado internacional
Nasce de uma constituição
As unidades parciais têm direito de secessão (separação)
As unidades parciais não têm direito à separação
As unidades parciais são dotadas de soberania
As unidades parciais são dotadas de autonomia


Unidade parcial: é a denominação da parte na forma de estado. A unidade parcial recebe os mais variados nomes. A Suíça recebe o nome de federação, apesar de ser uma confederação; lá a unidade parcial recebe o nome de Cantão; na Alemanha (que é uma federação) a unidade parcial recebe o nome de Laiander; na Argentina recebe o nome de província; existem determinadas unidades parciais denominadas de departamentos. Na nossa federação, as unidades parciais recebem o nome de Estados-membros.
Nós vivemos em uma federação, o que nos é revelado pelo art. 1º da CF. Aliás, nós vivemos em uma federação desde 1881. A nossa Constituição Republicana criou a nossa federação.
Por que lá nos EUA cada Estado possui o seu Código Penal, o seu Código de Processo Penal? Por que no Texas tem a pena de morte e em Nova York não tem? Se lá é uma federação e aqui também é uma federação e nós não temos essa realidade? 
Isto é em decorrência do processo histórico da federação norte-americana. Percebam que lá, nos EUA, existiam treze colônias; treze estados independentes que se agregaram: os EUA é uma federação por agregação ou federação centrípeta.
Aqui no Brasil nós tínhamos, até a Proclamação da República, um Estado Unitário que se repartiu, portanto, a nossa federação é por desagregação ou centrífuga.
As províncias, até 1789, não tinham um legislativo próprio; não editava leis. A federação foi criada com a Proclamação da República em 1789, surgindo então a nossa federação.
Em razão disso, lá na federação americana, os Estados-membros têm maior autonomia, por isso, tem o seu Código Penal; aqui os Estados-membros têm menos autonomia, porque o nosso Estado surgiu de um estado unitário que se desagregou; lá eram treze estados independentes que se uniram (agregação).
Da mesma forma, é com a legislação eleitoral: cada Estado Americano tem o seu Código Eleitoral. Em alguns Estados, se um candidato eleito a representante (senador, deputado) vier a falecer antes da posse, quem assume é a sua mulher. Noutros Estados, é o governador quem escolhe quem vai lhe substituir; depende do Estado. Isso se dá em virtude de maior autonomia dos Estados.
CARACTERÍSTICAS DA FEDERAÇÃO
I - Indissolubilidade do vínculo – o vínculo é indissolúvel, porque as unidades parciais não têm direito de separação ou de secessão. Esta característica se encontra presente na nossa Constituição – art. 1º:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
Essa característica é tão importante que o legislador constituinte nos dá notícia de alguns instrumentos para protegê-la:
a) Intervenção Federal – art. 34, CF:
Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:
I - manter a integridade nacional;
A Intervenção Federal é um instrumento que protege a indissolubilidade do vínculo.
Imaginemos o seguinte: o Rio Grande do Sul quer se separar do Brasil; criar uma república gaúcha, isso é possível?
Não, porque a união é indissolúvel; é caso de intervenção do todo na parte.
Esse tema é tão importante que o Direito Penal (que é a última ratio) também é um instrumento da indissolubilidade do vínculo.
O art. 109, IV, da Constituição Federal fala em crime político (competência da Justiça Federal com atribuição da Polícia Federal). Os crimes políticos estão na Lei 7170/83 – Lei de Segurança Nacional. Pregar contra a Federação é crime federal. Art. 11, dessa Lei:
Art. 11 - Tentar desmembrar parte do território nacional para constituir país independente.
Pena: reclusão, de 4 a 12 anos.
Tudo para proteger a indissolubilidade do vínculo, que é uma característica importante da Federação. Tanto que, se por acaso, o cidadão for condenado ou absolvido por um crime político, só cabe um recurso: Recurso Ordinário diretamente para o STF, tal a importância desse tipo de crime - art. 102, II, “b”, CF:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
II - julgar, em recurso ordinário:
b) o crime político;
II – Divisão constitucional de competência – só existe federação se tiver divisão constitucional de competência; esta característica se encontra na nossa Constituição – compete a União (art. 21 e 22); compete aos Estados-membros (art. 25); compete ao DF (art. 32); compete aos Municípios (art. 29 e 30). Temos ai uma divisão constitucional de competência.
III – Participação das unidades parciais (Estados-membros, DF) na formulação da vontade geral - eles participam da criação da lei, porque no Senado estão os representantes dos Estados-membros e do DF (art. 46, CF) e na Câmara dos Deputados estão os representantes do povo (art. 45, CF). Lembre-se que os senadores não são os representantes do povo, mas sim dos Estados-membros e do DF. O segundo artigo que nos revela a participação das unidades parciais na vontade geral é o art. 60, III, da CF:
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
Assim sendo, temos na nossa Constituição, essa característica da federação, qual seja, a participação das unidades parciais na formulação da vontade geral.
IV – Existência de um tribunal encarregado de manter a supremacia da constituição. Nós temos, no Brasil, um Tribunal que é o encarregado da guarda da Constituição: o STF – art. 102, I, CF:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
V – A própria existência da Constituição - só há que se falar em federação com uma Constituição. Porque a confederação possui Tratado Internacional.
Portanto, uma característica dessa forma de estado, federação ou federativa, é a própria Constituição. A forma de estado é uma cláusula pétrea; é um núcleo intangível  da Constituição – art. 60, §º 4º:
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
Aqui, neste dispositivo, a nossa Constituição é super-rígida.
2 - Forma de Governo  - nós respondemos a seguinte pergunta:
De que maneira o poder é exercido dentro de um território?
Respondendo a esta indagação, chegaremos à forma de governo.
No ano de 340 AC, Aristóteles disse: existem três formas de governos: Monarquia (governo de um só) Aristocracia (governo de mais de um, porém de poucos) e República (governos de muitos).
Para Aristóteles, essas três formas de governos poderiam ser corrompidas, viciadas. Se a Monarquia fosse viciada, corrompida, nós teríamos a Tirania. Se a Aristocracia fosse viciada, corrompida, nos teríamos a Oligarquia. Se a República fosse viciada, teríamos a Demagogia.
Em 1513, Maquiavel, no livro “O Príncipe”, disse que os Estados ou são Principados ou são Repúblicas. A partir daí, duas formas de governos: Monarquia, que ele chamava de Principado, ou República. É lógico, que em 1513, essa diferença entre Monarquia e República tinha um sentido. Hoje, ao menos no Ocidente, não temos Monarquias puras; nós temos Monarquias Constitucionais.
Respondendo aquela pergunta: na Monarquia o poder é exercido de maneira hereditária, vitalícia e irresponsável; na República o poder é exercido de forma eletiva, temporária e responsável (existe a responsabilidade política, pelo menos em tese).
A forma de governo não é uma cláusula pétrea; existe quem defenda que seja. Porém, majoritariamente entende-se que não é uma cláusula pétrea.
Apesar da forma de governo não ser uma cláusula pétrea, a forma de governo republicana é um princípio constitucional sensível em sede estadual.
Os princípios constitucionais sensíveis estão no art. 34, VII, CF:
Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:
VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) direitos da pessoa humana;
c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.
3 – Sistema ou regime de governo - deve-se responder a seguinte pergunta:
De que forma se relaciona o legislativo e o executivo? 
A maneira pela qual se relaciona o legislativo e o executivo marca o sistema de governo.  É um traço diferenciador do sistema ou regime de governo, a relação entre o legislativo e o executivo.
Nós temos, em regra, dois sistemas ou regimes de governo: Presidencialismo e Parlamentarismo.
As diferenças entre eles são:

PRESIDENCIALISMO
PARLAMENTARISMO
Uma única autoridade exerce a função executiva – art. 76, CF:
Art. 76. O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado.
Duas ou mais autoridades exercem a função executiva
Executivo monocrático: uma única autoridade exerce a função de chefe de estado e de chefe de governo
Executivo dual: as funções de chefe de estado e de chefe de governo são desempenhadas por autoridades distintas
Existe independência política do executivo em relação ao legislativo
Dependência política do executivo em relação ao legislativo
O mandato do chefe do executivo é determinado
O mandato daquele que exerce a função executiva pode ser reduzido pelo legislativo

Existem duas espécies de parlamentarismo:

a) Parlamentarismo Monárquico constitucional: rei exercendo a função de chefe de estado; primeiro-ministro exercendo a função de chefe de governo (Inglaterra, Espanha).
b) Parlamentarismo Republicano: presidente exercendo a função de chefe de estado; primeiro-ministro exercendo a função de chefe de governo (Itália, França).
Brasil - Parlamentarista – de setembro de 1961 até fevereiro de 1963: Tancredo Neves era o Primeiro-Ministro e João Goulart era o Presidente. O sistema ou regime de governo não é uma cláusula pétrea; não é um núcleo intangível da Constituição.
Importante: no art. 84 da Constituição Federal estão elencadas as atribuições do chefe do executivo; neste artigo nós temos um rol dessas atribuições; dentre estas atribuições estão aquelas que ostentam a natureza de atribuições de chefe de estado e aquelas que ostentam a natureza de chefe de governo. O art. 84 nos dá notícia das atribuições do chefe do executivo: o Presidente exercendo as duas espécies de atribuições de chefe de executivo; ambas desempenhadas pela mesma pessoa: o que significa dizer que nós temos um Estado que adota o sistema ou regime presidencialista. 
Art. 84, VII, CF:
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
VII - manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos;
Ao manter relações com estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos, o Presidente da República está a exercer a função de Chefe de Estado. Isso significa que, no exercício da função de Chefe de Estado, o Presidente fala, se manifesta, em nome da unidade nacional. Isso quer dizer que ele se manifesta em nome da República da Federativa do Brasil.
Para a ordem internacional, não interessa qual é a forma de nosso estado. Para a ordem internacional, não interessa se o nosso estado adota a forma de estado unitária ou composta; se é composta a federação ou confederação; na ordem internacional, essa realidade não tem qualquer valor, porque o que interessa é o exercício da chefia de Estado pelo Presidente da República; o que interessa é que nós pertencemos a uma soberania.
Ainda no art. 84, VII – cabe, também, ao Presidente, acreditar os seus representantes diplomáticos.
Exemplificando: um Embaixador dos EUA é nomeado pelo Presidente dos EUA. Para que ele (Embaixador) possa exercer as suas atribuições dentro do território nacional, precisa ser acreditado pelo Presidente da República no exercício da função de Chefe de Estado. Ele (Embaixador), chegando ao Brasil, vai ao Palácio do Planalto, marca uma audiência com o Presidente da República; entrega as suas credenciais ao Presidente que as lê e acredita aquele representante diplomático, ou seja, dar a ele a possibilidade de exercer as suas atribuições dentro do território nacional.
Pergunta: esse é o exercício de Chefe de Estado ou de Governo?
Função de Chefe de Estado.
Art. 84, VIII:
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;
Esta é, também, uma atribuição de Chefe de Estado.
O Presidente, quando celebra um tratado internacional, está a exercer a função de Chefe de Estado.
Percebam que no exercício da atribuição de Chefe de Estado, o Presidente fala em nome de todos nós.
Ele se manifesta em nome da República Federativa do Brasil, defendendo, zelando pelo pacto federativo.
Exercício da atribuição da forma de governo – art. 84, II:
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
II - exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal;
Quando o Presidente exerce a chefia superior da Administração Pública ele está a exercer a função de Chefe de Governo. Nesse instante, o Presidente não está falando pela República Federativa do Brasil, mas em nome da União Federal, que é uma Pessoa Jurídica de Direito Público Interno.
É lógico, que a República Federativa do Brasil, não possui servidores próprios; ela se vale dos próprios servidores da União Federal.  Percebam que, tecnicamente, deveria ser o Presidente a nomear os delegados da polícia federal, mas ele delega isso ao Ministro da Justiça.
Essas duas atribuições são enfeixadas na mesma autoridade, por isso, executivo monocrático.
Isso não ocorre no Parlamentarismo. 
No parlamentarismo, temos duas ou mais autoridades exercendo a função executiva.
Nós temos duas espécies de parlamentarismo: parlamentarismo monárquico constitucional e parlamentarismo republicano. 
No parlamentarismo monárquico constitucional, nós temos reis exercendo a função de Chefe de Estado e Primeiro Ministro exercendo a função de Chefe de Governo; diversamente do que ocorre no parlamentarismo republicano, onde o Presidente exerce a função de Chefe de Estado e Primeiro Ministro exercendo a função de Chefe de Governo. No parlamentarismo nós temos o denominado executivo dual e no presidencialismo temos o denominado executivo monocrático

ELEMENTOS CONSTITUTIVOS OU ESTRUTURAIS DO ESTADO

São quatro os elementos constitutivos ou estruturais do Estado: 
1. Poder;
2. Território;
3. Povo;
   4. Objetivos.
Esses são os elementos constitutivos do Estado. Não existem Estados sem estes quatro elementos: poder, território, povo e objetivos. A matéria Direito Constitucional trata das relações entre estes elementos estruturais do Estado. Tratemos, então, do primeiro elemento que é poder.
Sociologicamente, poder significa a capacidade, a possibilidade de imposição de vontade sobre a vontade de terceiros. Existem várias formas de exercício de poder. Existe o poder da diligência; existe o poder físico; existe o poder da beleza, existe o poder do dinheiro.
O Estado exerce o poder político, já que ele é uma sociedade politicamente organizada. Poder político significa a possibilidade da imposição da violência legítima. Exemplo: mandado de busca e apreensão - se a pessoa não estiver em casa chama-se testemunhas e arromba a porta da casa: isso é o exercício do poder político; exercício da violência legítima, mas fundamentada porque o nosso Estado prevê isso. Outro exemplo é da interceptação telefônica: o juiz decreta a interceptação; ouve-se a conversa íntima entre dois cidadãos; está se exercendo a violência legítima. Cumprimento de mandado de prisão é uma violência, mas é uma violência legítima. Porque nós em determinado momento histórico entendemos de criar essa realidade chamada Estado. Isso, para evitar que aquele mais forte pudesse impor a sua vontade sobre o mais fraco fisicamente. Para que nós não voltássemos ao denominado estado de natureza em que uns lutavam contra os outros. O Estado exerce o poder político, essa violência legítima, paraque nós não voltemos à barbárie. Essa violência legítima é denominada de obrigatoriedade ou coercibilidade. O Estado impõe a sua vontade.
A nossa Constituição dá ao termo poder vários sentidos; várias acepções; vários significados. O primeiro sentido de poder na nossa Constituição está no art. 1º, parag. Único:

"Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição".



 Se todo poder emana do povo, nós vivemos em uma democracia.
Demo = povo; cracia = dominação.
Significa dominação do povo. “Todo poder emana do povo”: vivemos em uma democracia. Esse é o primeiro sentido de poder na Constituição. Esse primeiro sentido de poder quer dizer soberania popular. Significa dizer que todo poder não emana de Deus, pois nós não estamos numa teocracia (onde todo poder emana de Deus) como no Irã ou no Vaticano. Vivemos em uma democracia.
Mas que tipo de democracia?
De acordo com o parag. único do art. 1º, da Constituição, nós vivemos em uma democracia semi-direta ou representativa. Significa dizer que, em regra, o povo, que é o titular do poder, o exerce através de representantes eleitos.
Existem exceções em que o povo, que é o titular do poder, o exerce diretamente, sem intermediários, sem representantes:
- Tribunal do Júri – art. 5º, XXXVIII, CF: é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei,  assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;
- Ação Popular – art. 5º, LXXIII, CF: qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;
- Iniciativa Popular – art. 61, § 2º, CF: A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles
- Consulta Popular - art. 14, CF: A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular.
A Consulta Popular se divide em Referendo e Plebiscito. A diferença entre plebiscito e referendo no direito latino é que o plebiscito é convocado antes da criação da norma (ato legislativo ou administrativo), e é o povo, por meio do voto, que vai aprovar ou não a questão que lhe for submetida. Já o referendo é convocado após a edição da norma, devendo o povo ratificá-la ou não.
Estas são as exceções em que o povo exerce o poder diretamente. Mas a regra é que, o povo, que é o titular do poder, o exerça por meio da democracia semi-direta ou representativa.

Também, encontra-se na doutrina quem qualifica a democracia como participativa: o povo, que é o titular da soberania, participa da organização do Estado. Exemplo disso: o povo discute orçamento da saúde; existe conselho municipal de segurança; existe conselho municipal de saúde. O povo aqui está participando da administração, da organização do Estado.


Trataremos agora do segundo significado do termo poder na nossa Constituição: Poder significando órgãos - art. 2º, CF:

 "São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário".



Devemos entender poder nesse dispositivo como “são Órgãos da União, independentes e harmônicos entre si o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.


Obs.: Tecnicamente, não é correto se afirmar que a nossa Constituição teria adotado a divisão tripartite de poder de Montesquieu; o correto seria falar que a nossa Constituição adotou a divisão orgânica de Montesquieu. Porque não divisão tripartite?  Porque o Poder é uno e indivisível; recebe o nome de soberania popular. Porque existem órgãos que exercem parcela deste poder (parcela da soberania do Estado), daí não é correto se falar em divisão triparte.


Terceira acepção do termo poder na Constituição: poder significando função: art. 44 - função legislativa; art. 76 - função executiva; art. 92 – função jurisdicional.

Art. 44. O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Aqui, poder deve ser entendido como “função legislativa”.

Art. 76. O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado. Deve-se entender poder aqui como “função executiva”.

E por fim:

Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário: Aqui, o termo poder significa “função judicial ou jurisdicional”.

Concluindo: o poder é uno e indivisível; ele recebe o nome de soberania popular; essa soberania popular em uma democracia semi-direta ou representativa, se manifesta através de órgãos; os órgãos exercem funções.


Encontra-se ainda na doutrina, quem denomina esse primeiro elemento constitutivo ou estrutural do Estado (o poder) como “soberania nacional” (que nada tem a ver com soberania popular) ou “organização”.
O segundo elemento estrutural do Estado é território.


2 – Território – é o componente espacial do estado; é a porção da terra sobre a qual o Estado exerce a sua jurisdição; a sua soberania; seu poder de mando; seu poder de império.  Existem duas espécies de territórios:

I – Território em sentido restrito – recebe outros nomes: território real ou território propriamente dito: é a porção de terra circunscrita pelas fronteiras nacionais. Dentro deste território estão contidos os seguintes elementos: solo, subsolo, mar territorial, espaço aéreo nacional e plataforma continental.

Mar territorial nacional: a Lei 8617/93 define mar territorial: doze milhas náuticas ou milhas marítimas; cada milha equivale a 1852 metros. Aqui sobre o mar territorial nós exercemos a nossa soberania; a nossa jurisdição.  Diz a Lei 8617/93 em seu art.


1º: "O mar territorial brasileiro compreende uma faixa de doze milhas marítimas de largura, medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular brasileiro, tal como indicada nas cartas náuticas de grande escala, reconhecidas oficialmente no Brasil".


Depois do mar territorial, a Lei faz referências à chamada Zona Contígua. Zona contígua: são doze milhas marítimas.  O mar territorial são doze milhas marítimas; com mais doze milhas, zona contígua. Art. 4º, da Lei 1852: "A zona contígua brasileira compreende uma faixa que se estende das doze às vinte e quatro milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem para medir a largura do mar territorial".


A referida Lei ainda faz referência a uma terceira realidade: a partir das doze milhas do mar territorial mais 188 milhas, temos a:


Zona Economicamente Explorável – art. 6º da Lei 8617/93:

Art. 6º - A zona econômica exclusiva brasileira compreende uma faixa que se estende das doze às duzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem para medir a largura do mar territorial.



Pode-se encontrar em alguns livros que a Zona Economicamente Explorável são duzentas milhas: as doze do mar territorial mais as 188, totalizando duzentas milhas. No entanto, a zona economicamente explorável se inicia depois do mar territorial, 188 milhas.


Diferença entre zona contígua e zona economicamente explorável: Zona contígua: o Estado pode exercer o seu poder de polícia para proteger o seu território; fiscalização aduaneira; exercer fiscalização sanitária e de imigração. Zona de exploração exclusiva: 12 milhas mais 188: o Estado tem a preferência na exploração econômica – a exemplo do poço de Tupi; petróleo, minerais, pesca.


A Lei 8617/93 foi editada em razão de um tratado internacional firmado entre a República Federativa do Brasil e a Jamaica que define o mar territorial.


Solo e Subsolo – onde se encontram ouro e diamantes.


Espaço aéreo nacional está dividido. Existe um costume em que o espaço aéreo é até aonde a tecnologia permita que as aeronaves nacionais militares e civis possam sobrevoar. Acima do espaço que as aeronaves possam sobrevoar é o espaço que pertence a toda a humanidade; para fins de pesquisas; é o espaço sideral, não tendo mais nada a ver conosco. 


Plataforma continental: é um bem da União; a atribuição da proteção é da Polícia Federal. Plataforma continental é o solo e o subsolo do mar territorial onde é encontrado o petróleo.

II – Território Cívico, por ficção ou por extensão: são determinadas situações jurídicas que a lei equipara a território; o status de território; é uma ficção.
Exemplos:

I – Embarcação pública nacional onde quer que esteja;
II – Embarcação particular nacional no mar territorial nacional e no mar internacional;
III – Aeronave pública nacional aonde quer que esteja;
IV – Aeronave particular nacional no espaço aéreo nacional e no espaço aéreo internacional.

Está previsto no art. 5º do Código Penal Brasileiro – Princípio da Territorialidade:

Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.

§ 1º - Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.



§ 2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil

Obs: Representação diplomática (Embaixadas, consulados) não são territórios por extensão. É lógico que existem determinadas imunidades decorrentes de tratados internacionais que retiram o poder de império do Estado em representação diplomática, mas não quer dizer que elas sejam território por extensão.
Tomar cuidado com a denominada passagem inocente – prevista na Lei 8617/93, art. 3º:

Art. 3º - É reconhecido aos navios de todas as nacionalidades o direito de passagem inocente no mar territorial brasileiro.

§ 1º - A passagem será considerada inocente desde que não seja prejudicial à paz, à boa ordem ou à segurança do Brasil, devendo ser contínua e rápida.

§ 2º - A passagem inocente poderá compreender o parar e o fundear, mas apenas na medida em que tais procedimentos constituam incidentes comuns de navegação ou sejam impostos por motivos de força maior ou por dificuldade grave, ou tenham por fim prestar auxílio a pessoas, a navios ou aeronaves em perigo ou em dificuldade grave.

§ 3º - Os navios estrangeiros no mar territorial brasileiro estarão sujeitos aos regulamentos estabelecidos pelo Governo brasileiro.

Terceiro elemento constitutivo ou estrutural do Estado:
3 - Povo – Vem definido no art. 12 da Lei Fundamental. Quando a Constituição fala em povo, ela está fazendo referência aos brasileiros natos e brasileiros naturalizados. Povo é o conceito de nacional. Assim, a Constituição não define estrangeiro; se chega ao conceito de estrangeiro por exclusão: será estrangeiro quem não for brasileiro nato ou quem não for brasileiro naturalizado. Povo é o componente pessoal do Estado. Povo não é sinônimo de população; povo não é sinônimo de habitante. População e habitante não são conceitos jurídicos; são conceitos geográficos, matemáticos, demográficos. Dentro do conceito de população e de habitantes estão os estrangeiros e os apátridas; percebam a diferença: povo são os brasileiros natos e naturalizados; habitantes e população é igual a povo + estrangeiros + apátridas (aqueles sem pátrias).


A Constituição se vale do conceito de população e habitantes no art. 45, § 1º:

§ 1º - O número total de Deputados, bem como a representação por Estado e pelo Distrito Federal, será estabelecido por lei complementar, proporcionalmente à população, procedendo-se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta Deputados.



Cidadão – existem dois sentidos para cidadão:


a) Cidadão em sentido restrito: é o nacional que exerce direitos políticos – art. 12 + art. 14, CF: vota e pode ser votado.
b) Cidadão em sentido amplo: aquela pessoa humana que possui direitos e pode contrair obrigações.


Exemplo: uma garota de 11 anos é cidadã em sentido lato; cidadã em sentido abrangente, porque ela tem direitos;  ela tem obrigações; diversamente, ela não é cidadã em sentido restrito, porque ela não tem amadurecimento; ela não tem tirocínio (experiência), para exercer direitos políticos; ela não vota e nem pode ser votada; ela é cidadã em sentido amplo; mas não é cidadã em sentido mais reduzido. Só quem pode ajuizar Ação Popular é cidadão em sentido restrito (é o nacional que exerce direitos políticos); quem vota e pode ser votado pode ajuizar Ação Popular – art. 5º, LXXIII, CF; uma criança de 10 anos não pode ajuizar Ação Popular, porque ela não é cidadã em sentido restrito; não vota nem pode ser votada; é cidadã em sentido lato; em sentido abrangente.


Quarto elemento constitutivo do Estado:


4 – Objetivos; Finalidades – para que serve o Estado? Para que e por que, em determinado momento histórico, nós abrimos mãos de parcela de nossos direitos e os colocamos sob a responsabilidade dessa realidade denominada de Estado?

O Estado tem determinados objetivos; o Estado é dotado de algumas finalidades; nós podemos reduzir essas finalidades, esses objetivos do Estado em uma única expressão: o objetivo de atingir o bem comum; a ordem pública. Esse é o objetivo da criação dessa entidade chamada Estado.


A Constituição Federal esclarece, evidencia o que venha ser esse bem comum no seu art. 3º:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.



É para isso que serve o Estado.


Uma constituição que elenca objetivos; uma constituição que traça compromissos; que traça metas a serem alcançadas, recebe a denominação de constituição compromissária; constituição dirigente. A nossa Constituição é dirigente; ela é compromissária; nós somos credores do Estado; o Estado nos deve o atingimento desses objetivos previstos no art. 3º.